Reconhecer as
especificidades da realidade do campo por meio do respeito à diversidade
que envolve as populações que vivem em áreas rurais. Este é um dos
objetivos do Grupo de Estudos e Pesquisas Formazon, da Universidade
Federal do Oeste do Pará (Ufopa). Criado a partir da necessidade de
debater a complexidade que envolve a formação de professores para a
educação em áreas rurais, o grupo está ligado ao Instituto de Ciências
da Educação (Iced) e tem caráter interdisciplinar. Há mais de duas
décadas tem-se dedicado a desenvolver pesquisas nessa área, com o que
conquistou a atenção de alunos, professores e pesquisadores.
Criado em 2008, o grupo participa
ativamente de discussões sobre as políticas municipais de educação do
campo e formação de professores. Por meio de estudos e debates oferece
subsídios para reformulação de cursos de formação inicial e continuada
de professores que atuam na educação do campo. Mantém duas linhas de
pesquisa: Formação de Professores e Educação do Campo. Agora, o grupo se
insere no Fórum de Educação do Campo do Baixo Amazonas, criado
recentemente, cuja primeira reunião será no próximo dia 20 de setembro.
O Formazon também analisa as práticas
pedagógicas de professores que atuam no meio rural. Tem contribuído
também para a formação de pesquisadores para atuarem nas linhas
pertinentes aos projetos desenvolvidos pelo grupo, além de atuar,
principalmente, na formação de professores para a escola do campo.
Segundo a professora Solange Ximenes (Iced), uma das integrantes do
grupo: “Entendemos que a qualidade da educação está vinculada à melhoria
da formação docente. Nesse sentido várias políticas têm sido pensadas
para a formação de professores objetivando melhor a qualidade dessa
educação, mas ainda é pouco”.
Entre os problemas enfrentados pelos
educadores do campo está a pouca escolarização dos professores. Em
Almeirim, por exemplo, 84% dos professores não possuem graduação. Em
Oriximiná, esse número é de 74,9. A situação é semelhante em todos os
municípios da região do Baixo Amazonas. “Nos últimos estudos que nós
temos realizado, percebemos que o professor desempenha um papel
fundamental na condução das estratégias educacionais. E se ele não
estiver bem informado, isso compromete o processo como um todo”.
“Outra questão percebida por nossos estudos é que muitas vezes a educação do campo tem um caráter urbanocêntrico, ou seja transfere-se para o campo o modelo aplicado nas cidades sem considerar as especificidades daquele contexto”.
A pesquisadora ressalta ainda que, na
formação dos professores, a realidade é a mesma. “No contexto de
observação da pesquisa, já presenciei aulas em condições muito
precárias. Não é só na infraestrutura."
A pesquisadora aponta a precarização do
trabalho do professor em escolas do campo como um dos principais
problemas a serem combatidos. “Em muitos casos, na escola há apenas um
professor e esse profissional é o responsável por todas as atividades.
Já presenciei situação em que a professora estava em sala de aula com
uma pilha de papéis, atendendo aos alunos e preenchendo formulários de
frequência, projetos sociais. Isso sem falar na confecção da merenda,
faxina da escola e até na higienização das crianças, dependendo do
caso”.
Ainda de acordo com o Fórum Paraense de
Educação no Campo, mais da metade das escolas não possui sanitário
dentro do prédio (62,5%), água potável (49,1%) e energia elétrica
(46,59%).
Outra questão que, para a professora
Solange Ximenes, “parece invisível aos olhos dos legisladores”, diz
respeito aos cumprimentos legais da lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), segundo a qual os alunos têm de cumprir 200 dias letivos
e 800 horas de “efetivo trabalho escolar”. “Se contabilizarmos, os
alunos frequentam 200 dias de aulas, porém 800 horas de efetivo trabalho
escolar eles não têm. Veja bem: uma professora com quatro turmas numa
mesma sala de aula. Ela não consegue dar 4h para cada uma das turmas
naquele ambiente. Os professores ficam sobrecarregados, trabalho até
além do humano”. O assunto foi tratado em artigo publicado na revista
eletrônica HISTDEBR, sob o título “A organização do Espaço e do tempo
escolar em classes multisseriadas: na contramão da legislação”.
Escola do Campo na pós-graduação -
Edvalda Nascimento, 45 anos, conhece bem a prática da educação em áreas
rurais. Durante uma década lecionou em classes multisseriadas, onde
também estudou. Hoje servidora do Instituto Federal do Pará (IFPA/Campus
Santarém), integra a equipe que coordena a licenciatura voltada para a
educação do campo, ofertada por meio do programa do Governo Federal
Pró-Campo.
Aprovada no Programa de Pós-Graduação
em Educação, que oferece o mestrado acadêmico, decidiu pensar, pesquisar
o tema. Está prestes a concluir dissertação intitulada “Formação de
Professores para a educação do Campo”. “Meu objetivo de pesquisa é
analisar como esse programa de formação específica contribuiu, em nível
pedagógico, para que esses professores pudessem atuar no campo”.
“Há sempre uma preocupação muito grande
com a questão metodológica; muitas vezes, o programa do professor,
especialmente do campo. São realizadas muitas capacitações para
elaboração de material didático. Os conteúdos relativos ao campo acabam
sendo deixados de lado. É necessário incluir questões como, por exemplo,
o agronegócio, o latifúndio, a sustentabilidade. Precisamos mostrar
para a sociedade até que ponto esse curso contribuiu para a formação de
professores”. Ela reconhece avanços na educação do campo: “Hoje existe
uma preocupação com a formação do professor que vai para as escolas do
campo. Ele precisa conhecer a realidade, aspectos que estão em discussão
no cenário nacional e que são próprios de quem vive no campo”.
Alguns resultados já começam a parecer.
A Licenciatura em Educação do Campo do IFPA deve passar em breve por
uma reformulação. O GT de Educação do Campo, que reúne 12 campi do
instituto, estuda uma proposta de reformulação do curso, já baseada
nessas pesquisas em andamento. “A ideia é que este estudo seja um
parâmetro para os institutos, para as universidades. Uma espécie de
ponto de partida de onde os programas de formação de professores para a
educação no campo devem partir”, conclui a mestranda.
Experiências - O
professor Rainei Cardoso é da Escola São Miguel, Planalto do Ituqui.
“Moramos num local distante do centro da cidade, e de difícil acesso.
Temos apenas um ônibus por dia para sair de lá e a doença não escolhe
hora para acontecer. Nós chamamos os 'curadores' da comunidade para
trocar experiências com os alunos do ensino fundamental para não deixar
morrer esse conhecimento. Fabricamos xaropes, chá, banhos, plantamos as
ervas curativas e com isso as pessoas conseguem amenizar alguns
problemas”.
Um dado preocupante. Informações do
Fórum Estadual de Educação do Campo dão conta de que nos últimos 15 anos
foram fechadas no Pará 4.411 escolas; só na região do Baixo Amazonas
foram 36. O Fórum disponibiliza o Disk Denúncia contra o fechamento de
escolas do campo: (91) 99191-7282.
Ascom/Ufopa
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