quarta-feira, 9 de setembro de 2015

MPEduc realiza diagnóstico e promove audiência pública sobre Educação em Guajará (AM)



MPEduc (AM) - Membros dos Ministérios Públicos Federal e Estadual visitaram escolas, conversaram com professores, alunos e gestores e ouviram as reivindicações da população sobre o tema

Escolas públicas sem banheiros, instaladas a poucos centímetros de barrancos em erosão, crianças bebendo água retirada do rio Juruá em baldes de limpeza e sem qualquer tratamento, escolas sem iluminação e ventilação, merenda escolar precária e escassa. Esses e tantos outros cenários tristes foram encontrados pela equipe do projeto Ministério Público pela Educação (MPEduc) no município de Guajará (a 1.494 quilômetros de Manaus), como parte do diagnóstico realizado in loco pelo projeto, que chegou no dia 26 de agosto à localidade, onde permanece até hoje (3).

As visitas abrangeram 11 escolas da zona rural e três escolas da zona urbana de Guajará, sob a coordenação da procuradora regional dos Direitos do Cidadão no Amazonas e responsável pelo MPEduc no Estado, Bruna Menezes, e do promotor de Justiça atualmente responsável pela Comarca de Guajará, Iranilson Ribeiro, representante do Ministério Público do Estado do Amazonas (MP/AM). As situações mais precárias foram encontradas nas escolas rurais mais distantes da cidade, a mais de quatro horas de navegação pelo sinuoso rio Juruá.

A inspeção do MPEduc flagrou escolas funcionando sem merenda, sem material escolar adequado e suficiente, sem banheiros, sem iluminação e sem água potável, à margem de qualquer assistência do poder público. A disposição dos professores em ensinar também se mostrou prejudicada, já que boa parte deles reclamou de atrasos no pagamento dos salários por parte do Município de Guajará. “Já passamos três, até quatro meses sem receber. Às vezes até suspendemos as aulas porque não temos como chegar à escola sem dinheiro para o transporte”, relatou uma professora que não quis se identificar. Por não ser concursada, ela teme por represálias.

Zona rural – Até chegar à Escola Municipal São José, na Comunidade Rebojo, é preciso enfrentar mais de quatro horas de viagem pelo rio Juruá, com seus bancos de areia submersos nessa época do ano. A escola atende 18 alunos na modalidade multiseriada (alunos do 1º ao 5º ano na mesma turma). No local, a equipe do MPEduc verificou que a merenda destinada para o mês mal seria suficiente para elaborar três dias de refeição. Feijão acondicionado em sacos plásticos, um pouco de alho, dois pacotes de macarrão, bolacha água e sal e farinha de milho era tudo o que a escola tinha no momento da visita para fazer a merenda das próximas semanas.

Poucos centímetros de chão separam a entrada da Escola Municipal Boa Vista, na Comunidade Chico Elias, da margem de um barranco que aumenta a cada chuva e a cada ciclo da cheia, oferecendo risco de acidentes às crianças. Na escola, os representantes dos MPs encontraram um grande balde que servia de bebedouro para as crianças. Segundo a professora, a água é retirada do rio e armazenada no balde, de onde os alunos tiram água usando o mesmo copo sempre que sentem sede.

Perguntadas sobre o banheiro, as crianças levaram a equipe do MPEduc até o que eles chamam de sanitário – uma pequena construção em madeira com um buraco no assoalho, por onde caem os dejetos que ficam armazenados em covas rasas, logo abaixo do piso – em meio a bananeiras, a alguns metros de distância da escola. Em quatro escolas visitadas, sequer existem sanitários. As crianças são obrigadas a fazer suas necessidades fisiológicas na mata.

  Situação na cidade – A cena se repetiu em quase todas as escolas rurais visitadas pelo MPEduc. Nas escolas da cidade as principais deficiências detectadas se referem a problemas na estrutura física como fiação elétrica exposta, bebedouros em péssimas condições de conservação e uso, ausência de extintores de incêndio e iluminação dos ambientes precária. A falta de ações de conscientização em relação à violência e ao consumo de drogas, problemas relatados com frequência por professores e gestores, e ainda remessa insuficiente de livros didáticos para uso nas turmas foram constatados durante as inspeções in loco.

O município foi escolhido para receber as ações do MPEduc em razão da baixa pontuação no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), calculado pelo Ministério da Educação (MEC). Em 2013, Guajará atingiu apenas 3,7 pontos no Ideb, quando a meta estabelecida é de, no mínimo, 6 – em uma escala de 0 a 10. O Ideb é calculado com base no fluxo escolar (aprovação, reprovação e abandono) e na média de desempenho das avaliações de língua portuguesa e matemática obtidas na Prova Brasil (municípios) e no Sistema de Avaliação da Educação Básica (estados).

Para a procuradora regional dos Direitos do Cidadão, Bruna Menezes, mesmo já estando bem abaixo da meta nacional, a nota de Guajará no Ideb sequer representa uma amostra razoável da qualidade da educação no município, já que somente sete escolas, sendo apenas uma da zona rural, foram avaliadas, de um total de 64 unidades públicas de ensino.

Educação em pauta – Na noite de terça-feira (1º), uma audiência pública para debater a situação da educação na cidade foi realizada pelo projeto, sob a coordenação da procuradora regional dos Direitos do Cidadão no Amazonas e responsável pelo MPEduc no Estado, Bruna Menezes, e do promotor de Justiça de Guajará, Iranilson Ribeiro, representante do Ministério Público do Estado do Amazonas (MP/AM). As participações da comunidade no evento levantaram problemas como furtos na escola, escassez de merenda escolar, deficiências na estrutura física e no transporte escolar e ausência dos pais na vida escolar dos filhos.

Também participaram do evento o coordenador do projeto MPF na Comunidade, procurador da República Rafael da Silva Rocha, o procurador da República no município acreano de Cruzeiro do Sul Thiago Corrêa, o defensor público na Comarca de Guajará, Bruno Soré, a supervisora regional da Secretaria de Estado da Educação no Amazonas (Seduc), Eleni Góes, a coordenadora regional da Seduc em Guajará, Nara Melo, e a secretária municipal de Educação da cidade, Maria Izete Saraiva.

Todas as manifestações e questionamentos apresentados durante a audiência pública foram registrados em ata pela equipe do MPEduc e serão considerados na elaboração das recomendações a serem expedidas a partir do diagnóstico in loco e dos dados indicados nos questionários preenchidos por gestores e professores. Uma nova audiência pública de retorno deverá ser marcada no próximo ano para ouvir novamente a população de Guajará sobre as melhorias implementadas na prática a partir das recomendações do projeto.

NÚMEROS:

TOTAL DE ESCOLAS EM GUAJARÁ: 64
  • Zona rural: 58
  • Zona urbana: 6
Sendo:
  • Estaduais: 4
  • Municipais: 60
  • 55 das 64 escolas de Guajará NÃO possuem sanitários dentro da escola (86%)
  • 48 escolas de Guajará NÃO têm energia elétrica (75%)
  • 61 escolas NÃO possuem bibliotecas (95%)
  • Somente 30% das escolas (19) informaram que fornecem água filtrada
  • 98% das escolas (62) NÃO são atendidas por esgoto via rede pública
  • 95% das escolas NÃO têm acesso à rede pública de abastecimento de água (61)

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