por Raiana Ribeiro e Pedro Ribeiro Nogueira, do
Portal Aprendiz
“É preciso dar ao aluno ferramentas para que possa
entender o que é relevante e o que não é.”
Gerir o Conhecimento. É como o economista e
professor da Pós-Graduação na Pontíficia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP) Ladislau Dowbor encara o desafio de educar no século XXI. Do
escritório da sua casa, em São Paulo, o autor de mais de 40 obras sobre
economia, gestão pública e educação falou ao Portal Aprendiz sobre como as
inovações científicas e tecnológicas estão transformando os processos de
ensino-aprendizagem e obrigando indivíduos, empresas e governos a adotarem
novas medidas diante de um mundo regido pela informação.
“Quando falamos em educação a gente pensa em
professor, sala de aula e alunos. Eu passei a trabalhar com o conceito de
Gestão do Conhecimento, algo muito mais amplo e que envolve deslocamentos
profundos. A educação vista apenas como uma fase da vida que acabou. Isso
envolve cada vez mais gente, então temos que pensar o acesso e a interação com
o conhecimento durante todas as fases da vida.”
Para compreender a Gestão do Conhecimento, segundo
Dowbor, é preciso considerar três elementos. O primeiro é o fato de o
conhecimento ter se tornado o principal fator de produção em todas as
atividades econômicas. Já o segundo, encontra nas tecnologias de comunicação e
informação (TICs) peças fundamentais para o acesso e troca de conhecimento
produzido no planeta. E o terceiro vê na emergência do princípio da colaboração
uma mudança de paradigma nas relações entre aqueles que produzem conhecimento.
“Se eu te dou meu relógio eu fico sem ele. Se te
passo conhecimento, ficamos ambos com ele. O uso não reduz o estoque, o que
muda radicalmente todos processos econômicos, porque rende muito mais colaborar
do que se esconder atrás de royalties, patentes, copyrights e coisas do gênero.
Isso gera potencial para evoluirmos da guerra econômica, da desigualdade, da
hierarquização para uma democratização geral”, afirma ele.
Essa nova lógica tende a mudar radicalmente o papel
do professor. De acordo com Dowbor, não faz mais sentido pensar a transmissão
de conhecimento da cabeça do educador ou da apostila, do livro, para a cabeça
do estudante. “É preciso dar ao aluno ferramentas para que possa entender o que
é relevante e o que não é, para que aprenda a organizar sua memória
cientifica.” Nessa perspectiva, acrescenta o economista, o professor se
converte em um articulador de potenciais.
A Escola
Ora, se o conhecimento está em todas as partes,
qual será a função das escolas no futuro? A resposta parece simples, mas o
número de experiências pelo mundo que já conseguiram ressignificar o espaço
escolar denuncia o tamanho do desafio. Para Dowbor, a saída é cada vez mais a
escola assumir o papel de articuladora do conhecimento e formuladora de
perguntas.
“A grande questão é como formular a pergunta certa.
Quais conhecimentos eu preciso ter para responder essa pergunta? Precisamos
decorar menos fórmulas. Por isso acredito que no futuro vai aflorar com muita
força tudo que for ligado a metodologias.”
Em instituições onde isso já acontece – ele cita a
Escola da Ponte como exemplo – os problemas são escolhidos pelos alunos e em
função do interesse deles. “Isso faz uma ponte essencial entre o conhecimento e
a informação. Quando o aluno está interessado em algo e você dá instrumentos
para que ele pesquise, quando se trabalha por problemas e não por matérias, em
tempo corrido e não em fatias de cinquenta minutos, quando o professor ajuda
nas metodologias e não ensina a resposta, temos então um outro conceito de sala
de aula. É como Montaigne escreveu no século 16: “precisamos de cabeças bem
feitas, não bem cheias.”
Os professores e a escola, segundo ele, precisam
rever suas funções. “Ainda estamos na pré-história, enfrentando a liquidação do
lúdico e do artístico, da criatividade da criança e de sua vontade de conhecer.
Quando você senta o menino por 40 horas semanais, você resolve o problema dos
pais, não dele. Alguém que não gosta de uma matéria pode decorar e passar na
prova, mas não irá guardar. Os bancos se adaptaram rapidamente ao mundo
moderno, porque dá lucro. Mas a educação está no pelotão de trás”, afirma.
Para ele, há uma grita social muito forte sempre
que há contratações de professores, de inchamento da máquina pública, mas a
educação seria o melhor investimento, considera. “O papel do professor mudou
mas ele ainda é extremamente necessário. Na Finlândia, são seis alunos para
cada docente. E investir na educação pública é o melhor investimento que você
pode fazer”.
Educação e Desenvolvimento
As conclusões de Dowbor vão ao encontro das
resoluções da ONU, apresentadas no relatório “Ensinar e aprender: alcançar qualidade para todos”, divulgado no final de janeiro.
O documento, que acompanha as metas para a educação mundial, a serem alcançadas
até 2015, ressalta que “a educação reduz a pobreza, aumenta as oportunidades de
trabalho e impulsiona a prosperidade econômica”. Além disso, completa o texto,
“ela também melhora a probabilidade de as pessoas terem uma vida saudável,
aprofunda as bases da democracia e transforma atitudes para proteger o meio
ambiente e empoderar as mulheres”.
Nesse sentido, Dowbor reforça a importância de que
a educação não seja vista pelos governantes apenas como um “trampolim” para
conseguir um emprego ou elevar salários. “É preciso dar um norte para a
educação que vá além da empregabilidade”, ressalta. Por isso, o professor
propõe uma reflexão sobre o conceito de desenvolvimento, palavra tão alardeada
como solução para os problemas do mundo.
Em sua opinião, é preciso deixar de lado o Produto
Interno Bruto (PIB) e adotar indicadores que deem conta da qualidade de vida e
do avanço de direitos e garantias sociais. “Estamos chegando no limite. Temos
sete bilhões de pessoas, com 80 milhões a mais por ano, a TV empurra produtos,
um consumismo surrealista que liquida a conectividade das pessoas, que
substitui a família por encontro com mercadorias, gerando uma crise social agravada
pela desigualdade.”
Em lugar de alimentar essa realidade, Dowbor
acredita que devemos nos perguntar: “Estamos vivendo melhor? Se sim, não
precisa aumentar o PIB. Se você consegue viver de maneira melhor e honesta,
acho que é o caminho”, finaliza.
Clique aqui para ler a entrevista “Gestão do
Conhecimento Local”, cedida por Ladislau Dowbor para o livro “Pesquisa-Ação
Comunitária: Coleção de Tecnologias do Bairro-Escola”, cedida por Ladislau
Dowbor para a Associação Cidade Escola Aprendiz.
Conheça o trabalho de Dowbor
Ladislau
Dowbor leva tão a sério a ideia de compartilhamento do conhecimento, que criou
um site onde disponibiliza toda sua
produção acadêmica, além de artigos e notícias que considera de interesse.
http://dowbor.org/2014/03/ladislau-dowbor-educacao-vista-apenas-como-uma-fase-da-vida-que-acabou-marco-2014-3p.html/
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