A pedido do Ministério Público Federal no Amazonas
(MPF/AM), a Justiça determinou a imediata reintegração de posse em favor
dos moradores da comunidade Yupirunga, família indígena do povo
Karapana, às margens do rio Tarumã-Açu, zona rural de Manaus. A decisão
liminar determina a demolição, em até 48 horas, do muro erguido pelas
empresas Suplex Serviços de Manutenção de Equipamentos de Refrigeração e
Costa Rica Serviços Técnicos e pela pessoa física Douglas Araújo de
Freitas (ou Douglas Costa), sócio-administrador da empresa Costa Rica.
Imagem aérea da cidade de Manaus. Foto: iStock
Os moradores da área comunicaram aos responsáveis pela obra que o
terreno estava sob litígio judicial e que, portanto, não poderiam
continuar a construção. Após erguido, o muro impediria o acesso de todas
as famílias das imediações ao rio Tarumã-Açu e às fruteiras, locais
onde toda a comunidade busca plantas medicinais, além de comprometer
acesso ao igapó onde realizam atividade de pesca de subsistência. Após o
contato, as obras foram intensificadas e os moradores coagidos,
inclusive por ação policial.
Diversos documentos e estudos antropológicos atestam que os indígenas
Karapana habitam o local há mais de 30 anos, havendo inclusive ação de
usucapião em seu favor, pendente de julgamento na Justiça Federal. De
acordo com a decisão judicial, fica expressamente garantido o legítimo
direito de uso e posse à família Karapana, bem como o direito de
passagem aos demais moradores, sob pena de multa diária de R$ 50 mil.
Se, ao fim do prazo estipulado, a obra não estiver desfeita e área
totalmente desocupada e limpa, a Justiça realizará o bloqueio de bens a
fim de garantir os valores necessários à execução da ordem. Os réus
ficam proibidos de intervir no local, seja por meio de obras, derrubada
de árvores; seja no intuito de constranger os moradores ou dissuadi-los
para que vendam suas posses.
Irregularidades da polícia – A decisão determina ao
estado do Amazonas a abstenção de acobertar ou proteger invasão na área.
Isso se deve ao fato de que, após a advertência dos indígenas aos
responsáveis pela obra, agentes da Polícia Civil compareceram com
viatura ao local, ingressaram armados ostensivamente no terreno da
família Karapana, sem qualquer mandado judicial.
Conforme relatos ao MPF, quando um membro da família compareceu ao
20º Distrito Integrado de Polícia (DIP) para registrar a ocorrência, o
funcionário recusou-se a fazer o registro dos fatos sob a justificativa
de que tal demanda não era de atribuição da Polícia Civil, sugerindo que
a Corregedoria fosse acionada. Além disso, há informações de que o
funcionário chegou a oferecer serviços de advocacia. Na ação, o MPF
afirma que há uma inversão total da prestação de segurança pública. “O
mesmo Estado que se nega a realizar Boletim de Ocorrência a indígena que
tem sua posse turbada, fornece viatura e policiais para o turbador
constranger os moradores”, ressalta trecho da ação.
Diante dos fatos, a Justiça deverá oficiar o governador do estado
para que adote providências sobre as irregularidades praticadas pela
Secretaria de Segurança Pública, com o uso indevido de viaturas e
policiais acobertando e protegendo invasão na área, bem como
oferecimento irregular de serviço de advocacia por funcionário público
que deveria realizar atendimento.
Visita in loco - No mesmo dia em que foi informado
sobre os fatos, em 19 de julho, o MPF compareceu ao local do conflito,
acompanhado de agentes da Polícia Federal no Amazonas e do coordenador
regional substituto da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Manaus. O
grupo constatou a presença de trabalhadores e de homens escoltando a
atividade e verificou a existência de intervenções no terreno e no igapó
utilizado pela comunidade.
Ao ser informado quanto à situação litigiosa da área e orientação
para suspender as obras até definição judicial ou por meio de eventual
acordo, o responsável pela construção fez contato com Douglas Araújo de
Freitas (ou Douglas Costa), que se identificou como proprietário do
local e afirmou possuir título de propriedade do terreno, tendo
adquirido a área em 2016 ciente de que estava sub judice. Por entender
ser o proprietário e possuir documentação, Douglas disse ao MPF que
continuaria a atividade, apesar das advertências.
Alguns dias após a vistoria, o Ministério Público foi comunicado da
intensificação das obras, com a presença de mais dez trabalhadores e da
derrubada de árvores frutíferas no local, causando ainda mais impactos
às famílias que ali vivem. Dessa forma, o MPF entrou com ação para
preservar a vida e a integridade física e cultural das famílias
indígenas afetadas pelos danos decorrentes dos fatos.
O processo segue em tramitação na 1ª Vara da Justiça Federal no Amazonas. Cabe recurso da decisão.
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